segunda-feira, maio 23, 2011

Forrageiras para áreas sujeitas à inundação ou alagamento temporário

Existem diversas espécies tolerantes ao excesso de água, para serem usadas em áreas de baixada com solo mal drenado.

Embora na maioria dos sistemas de exploração pecuária do Brasil o alagamento ou o encharcamento temporário do solo seja evento relativamente raro, em determinadas regiões é um problema crônico, freqüentemente enfrentado pelos produtores.
Em pastagens, o alagamento ou o encharcamento excessivo do solo pode ser causado, naturalmente, por períodos chuvosos intensos, má drenagem natural do solo e a elevação sazonal do nível de rios e do lençol freático. No entanto, o pisoteio do gado, o trânsito de máquinas, ou o impacto da chuva no solo descoberto, podem comprometer a capacidade natural de drenagem do solo devido à compactação, tornando esse solo suscetível a ocorrência de períodos mais freqüentes e relativamente mais prolongados de alagamento ou encharcamento. Assim, mesmo naqueles locais aonde o excesso de água no solo não seja naturalmente esperado, é possível que as práticas vigentes ou passadas de manejo contribuam para tornar esse estresse comum na pastagem.

Principais respostas das plantas ao alagamento ou encharcamento do solo
Devido à diminuição no suprimento de oxigênio para as raízes, o excesso de água no solo causa uma série de reações adversas nas plantas. Sistemas radiculares privados de oxigênio são pouco eficientes em suprir água e nutrientes minerais para si mesmos e para a parte aérea da planta. Nas espécies mais sensíveis ao excesso de água no solo, observa-se amarelecimento, queda de folhas, diminuição geral no crescimento, podendo culminar com a morte da planta.

Mecanismos de tolerância das plantas ao excesso de água no solo

Os mecanismos de tolerância das plantas ao alagamento do solo baseiam-se em uma série de características e estratégias adaptativas. A habilidade de determinada planta em desenvolver-se em solo alagado ou encharcado, pode ser determinada pela eficiência com que essa planta ajusta seu comportamento morfofisiológico, em resposta a esse estresse. A natureza dessas respostas pode variar grandemente entre espécies, ou mesmo dentro da mesma espécie (diferentes ecótipos), de acordo com a capacidade de aclimatação e em função da intensidade do estresse.

Opções forrageiras: Espécies mais difundidas

No Brasil existem diversas gramíneas forrageiras disponíveis comercialmente, ou já mais amplamente difundidas entre produtores e técnicos para uso em áreas de baixada, sujeitas a inundação ou alagamento temporário. A maioria dessas espécies não é nativa do Brasil. A seguir, será apresentada breve descrição de algumas dessas espécies.

Brachiaria humidicola (quicuio-da-amazônia)
Capim de origem africana, propagado por sementes ou vegetativamente, bastante difundido no Brasil e, em particular, na Amazônia. É tolerante ao excesso de água no solo, sendo, porém, melhor adaptado a solos com boa drenagem. Preferencialmente, deve ser plantado em áreas sujeitas a encharcamento periódico e não permanente. É um capim pouco exigente em fertilidade do solo, vegetando relativamente bem em solos pobres em nutrientes. Seu estabelecimento é lento, porém, uma vez estabelecido, mostra-se bastante agressivo, cobrindo bem o solo. Como perde a qualidade nutricional rapidamente com a idade, deve-se evitar que o capim fique "passado". Embora em geral tolere ataques de cigarrinha-das-pastagens, sob infestações mais altas desse inseto pode sofrer danos severos.
  
B. mutica x B. arrecta (capim - Tangola)
  
Segundo Alcântara e Bufarah (1988), o capim Tangola é um híbrido natural entre o capim Angola (B. mutica) e o Tanner Grass (B. arrecta), coletado em 1971 no estado do Rio de Janeiro e estudado pela primeira vez na estação experimental de Itaguaí, ex -IPEACS.
É uma gramínea agressiva, adaptada a solos de fertilidade relativamente baixa, desenvolvendo-se bem tanto em locais secos como em locais úmidos. Tolera solos encharcados ou sujeitos a alagamento periódico. Sua propagação é feita por meio vegetativo (mudas). Embora não provoque sintomas de intoxicação com a intensidade observada no capim tanner-grass, existem relatos de intoxicações leves em bovinos pastejando capim-tangola.

Resultados de produção em sistema adubado e irrigado:
VARIÁVEL
TANGOLA
GRAMA ESTRELA
BRAQUIARÃO
CV (%)
Forragem Acumulada (kg/MS/há)
40.833,3 A
32.358,0 B
27.821,0 C
13,14
Massa Forragem Resíduo (Kg MS/há)
2.331,8 A
2.062,8 AB
1.694,0 B
19,90
Massa Forragem Pré-Pastejo (Kg MS/há)
6.048,4 A
5.004,4 B
3.834,0 C
14,70
Taxa de acúmulo (Kg de MS/ha/dia)
112,0 A
88,7 A
76,2 A
13,14
Fonte: Fazenda Sta. Ofélia, AHA (2008)

Em trabalho conduzido por 12 meses de avaliação, na região de Selvíria-MS, o capim Tangola apresentou produção superior estatisticamente as espécies de capim B.Brizantha cv Marandu e Grama Estrela Africana.
  
Brachiaria arrecta (capim tanner-grass, braquiária do brejo)
Capim de origem africana, propagado vegetativamente, o capim tanner-grass foi, no passado, muito popular devido à agressividade e adaptação a solos alagados. No entanto, a partir dos anos 1970, seu cultivo no Brasil foi limitado pela constatação que poderia causar intoxicação a animais que o pastejavam e por ser hospedeiro do Blissus leucopterus, percevejo considerado praga de culturas como o milho e arroz. Por ser hospedeiro dessa praga, chegou a ser proibido por Portaria do Ministério da Agricultura. Mais recentemente, Raul Valério, pesquisador da Embrapa Gado de Corte, propôs que B. leucopterus nunca tenha ocorrido no Brasil, tratando-se, na verdade, de B. antillus que, supostamente, não causaria danos a culturas.

Brachiaria mutica (capim-angola, bengo)
Capim de origem africana, propagado vegetativamente, por meio do plantio de estolões ou mudas. É muito bem adaptado a solos de baixada sujeitos a alagamento temporário, estando difundido em praticamente todo o território nacional. Também se desenvolve em solos bem drenados, porém, não tolera secas prolongadas.



Setaria anceps (Setaria spachelata) (capim-setária)
Capim de origem africana que se desenvolve satisfatoriamente bem em solos úmidos de baixada, suportando alagamentos temporários. A setária apresenta, em comparação com outros capins, teores elevados de oxalatos em seus tecidos, especialmente quando as plantas são jovens, aos quais foram atribuídos casos de intoxicação em bovinos mantidos em pastejo. Essa característica levou a que a importância da setária como planta forrageira no Brasil fosse diminuída a partir da década de 1980.

Considerações finais
O alagamento ou a inundação temporária do solo tem sido fator limitante para o desenvolvimento da pecuária em diversas regiões do país. Em áreas naturalmente sujeitas a condições periódicas ou permanentes de umidade excessiva do solo, como em determinados locais do Pantanal mato-grossense ou do Baixo Amazonas, a pecuária vem sendo desenvolvida, desde os tempos coloniais, com base, principalmente, em plantas forrageiras nativas, naturalmente adaptados às condições ecológicas daquelas regiões.
Algumas dessas forrageiras, principalmente as gramíneas, apresentam grande potencial, ainda pouco explorado, como o exemplo do capim Tangola em Selvíria-MS que quando adubado e irrigado produziu mais que o capim Grama Estrela Africano e B.B. Marandu.

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